Em 16 de novembro de 1846, pela segunda vez em sua história, o Brasil expulsou um representante diplomático dos Estados Unidos por considerar que suas ações contrariavam os interesses nacionais.
O primeiro episódio semelhante havia ocorrido em 1824, quando Joseph Ray, cônsul dos EUA em Belém, foi expulso após o apoio da Casa Branca ao movimento separatista da Confederação do Equador.
O segundo diplomata a receber a ordem de retirada foi Henry Wise, embaixador norte-americano no Brasil desde 1844. O atrito começou em 31 de outubro de 1846, quando três marinheiros da corveta Saratoga provocaram uma confusão nas ruas do Rio de Janeiro. A polícia interveio de imediato e deteve os envolvidos.
A situação ganhou gravidade quando o tenente Alonso B. Davis, oficial da mesma embarcação, avançou de sabre em punho contra as autoridades para defender os marinheiros detidos. O confronto só não tomou proporções maiores porque soldados do Exército, responsáveis pela guarda do Palácio Imperial, intervieram rapidamente e conseguiram conter o oficial, prendendo-o junto com seus subordinados.
Ao ser informado dos acontecimentos, Henry Wise dirigiu-se ao Itamaraty em 2 de novembro de 1846, exigindo a libertação dos quatro detidos e a punição do comandante da Guarda do Palácio Imperial. Durante a conversa com o chanceler, insinuou que o Brasil não tinha autoridade para julgar ou punir militares norte-americanos, mesmo que o crime tivesse ocorrido em território brasileiro.
Diante da negativa do governo, Wise deixou o local fazendo comentários ofensivos sobre a aparência “mais ou menos escura” dos soldados brasileiros e sobre o “modesto uniforme” que vestiam.
A isso se somou outra atitude considerada desrespeitosa: o embaixador simplesmente ignorou o convite oficial para comparecer ao batizado da Princesa Isabel em 15 de novembro, cerimônia à qual todos os demais embaixadores estrangeiros compareceram.
Esses episódios levaram o governo imperial a declarar Henry Wise persona non grata e a exigir sua substituição até fevereiro de 1847. Em nota enviada ao Departamento de Estado, comunicou-se que, até que houvesse um novo representante, o Itamaraty não trataria de qualquer assunto com a embaixada norte-americana no Rio de Janeiro.
O prazo expirou em 1º de fevereiro de 1847 sem que o embaixador fosse substituído — um claro sinal de que Washington apoiava sua conduta. Em 25 de fevereiro, Wise ainda tentou ser recebido pelo chanceler Bento da Silva Lisboa, alegando portar uma carta do presidente dos EUA, mas a audiência foi recusada. Na prática, as relações diplomáticas ficaram paralisadas até 28 de agosto de 1847, quando Henry Wise deixou o Brasil definitivamente.
Quanto à crítica feita por ele ao uniforme “modesto” dos soldados brasileiros e à cor de sua pele, cabe lembrar que a farda era a mesma para todos — independentemente de origem ou aparência. Bem diferente era a realidade do Exército americano, que manteve batalhões segregados por raça até 1948. Cada país, afinal, refletia seus próprios valores.